Conheça as dificuldades vividas pelos nossos produtores de leite no Estado
A alta no preço do leite longa vida se tornou um dos assuntos mais comentados nas redes sociais depois que o litro passou a ser encontrado nos mercados e padarias do Brasil entre R$ 7 e R$ 10 nas últimas semanas.
O preço do leite costuma subir durante a entressafra, que vai de abril até junho, de acordo com o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea).
É quando o clima mais seco prejudica a disponibilidade e a qualidade das pastagens.
Contudo, neste ano, lidar com a entressafra ficou ainda mais complicado para o produtor, o que faz refletir nos preços nos mercados, afirma a pesquisadora do Cepea Natália Grigol. Ela aponta mais dois motivos para a alta do leite:
- os efeitos do fenômeno La Ninã, sobretudo no final do ano passado e início deste ano;
- e o aumento nos custos de produção.
Porém diante de tantos aumentos e cargas tributárias o brasileiro tem recorrido às redes sociais para expor sua indignação referente a esse produto que é um dos mais consumidos nas mesas dos brasileiros desde o período da Política do Café Com Leite.
Para entendermos mais sobre o que está acontecendo, fomos até a propriedade da família Castelli que produz leite na localidade de Passo do Padre no interior de Selbach.
Segundo o empresário e produtor de leite Adelir Castelli o desânimo entre os produtores de leite já começa afetar a vida financeira de quem produz e entrega para as grandes empresas o insumo,
“Neste ano em especial, um ano atípico e de grande recessão devido a vários fatores que vem desde uma pandemia é uma guerra no leste europeu, os insumos para a produção aumentaram de forma rápida e pesada no bolso de quem trabalha na área. Devido à estiagem severa que tivemos no estado, a própria pastagem foi afetada, chegando a atingir as pastagens de verão, quem plantou não conseguiu aproveitar. A silagem de milho que é tão importante na alimentação animal, devido ao tempo foi de baixa qualidade, e para corrigir essa silagem a própria ração está com um custo muito elevado. Muitos produtores abandonaram a produção devido a esse fator. E para ficar pior o clima não está ajudando, o plantio do soja acabou ficando afetado, para se ter uma ideia em anos bons, plantávamos em março e em maio já conseguíamos ter boas pastagens para a alimentação do gado, esse ano por consequência do clima o plantio ocorreu em maio, ou seja, se tornou insuficiente.”
“Infelizmente não temos muitas alternativas, para suprir os problemas estamos tendo que deixar o gado no pouco pasto que ainda resta, porém dessa forma o gado destrói toda plantação. Com todos esses fatores ainda temos que lidar com a falta de leite no mercado mundial. Isso acaba encarecendo muito o preço do leite, é a lei da oferta e procura. Tirando todos esses fatores que pesam no bolso de quem produz, ainda lidamos com a questão da saúde animal. Hoje em dia não podemos só depender da pastagem, o animal necessita de um acompanhamento mais cirúrgico, na alimentação do animal, além do pasto, da silagem, da ração ainda precisamos contabilizar os medicamentos e os nutrientes que são agregados na alimentação animal, para que a vaca produza um leite de qualidade, toda alimentação animal foi se encarecendo nos últimos anos. Tanto a alimentação concentrada (ração) quanto a volumosa (pastagem) foram afetadas pela alta de combustíveis e fertilizantes. Isso levou muitos pecuaristas a saírem da atividade ou a enxugarem investimentos,” ressalta Adelir.
Segundo Rossângela Casteli, um dos pontos principais para se entender o problema que vivem os produtores, é a própria linha produtiva e a rotina do produtor de leite,
“Essa é uma incógnita que as pessoas não conseguem entender como funciona o tambo de leite, para muitos a vaca dá leite em caixinha, quando isso na verdade não é assim que funciona, o produtor é que precisa tirar o leite e encaminhar ao setor produtivo. O produtor de leite não tem feriado, não tem sábado e nem domingo, são 365 dias por ano realizando o mesmo trabalho, porém nossa prioridade como produtor de leite sempre vai ser o bem estar animal. Acordamos cedo, com chuva, frio, sol e calor, buscamos os animais sempre no momento certo, pois o animal precisa realizar a ordenha no momento correto. Para o pequeno produtor de leite, em especial a produção em familiar é extremamente complicado e cansativo, pois além do bem estar animal também somos humanos e estamos sujeitos também a prejudicar nossa própria saúde. Para se ter uma ideia das dificuldades enfrentadas quando o assunto é a saúde, se uma vaca ficar doente, precisamos tratar ela, nesse momento o uso do antibiótico é fundamental, porém dependendo da situação o antibiótico acaba afetando a qualidade do leite e nesse momento a perda é muito grande, pois os próprios testes que são realizados na qualidade do leite apontam isso, ou seja a produção é afetada por diversos fatores, chegando muitas vezes a ser descartada no momento do teste. Assim também é com as células somáticas. O leite precisa ser puro, livre de bactérias e com alta qualidade, toda produção é extremamente fiscalizada.”
Rossângela também ressalta que, nesse período, os insumos que mais pesaram para o produtor foram: a ração — por conta da valorização no mercado de grãos —, o aumento de exportações de grãos e a queda na disponibilidade interna, os suplementos minerais, os fertilizantes e o combustível.
De acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) de junho — considerado a prévia da inflação oficial do país — o aumento no preço do leite começou a ser registrado de fevereiro para março:
- fevereiro: 1,04%
- março: 3,41%
- abril: 12, 21%
- maio: 7,99%
- junho: 3,45%
Já no campo, o preço do leite captado em abril deste ano e pago aos produtores em maio subiu 4,4% frente ao mês anterior. Em relação a maio do ano passado, o aumento é de 11,8%.
"Ainda que o mercado de grãos sinalize preços mais baratos com o início da safra, é possível que a demanda global drene a oferta doméstica — e isso pode ser intensificado pelo câmbio desvalorizado. Por isso é difícil prever uma reversão dos preços de alimentos, como os derivados, diante do mesmo posicionamento macroeconômico que o Brasil tem adotado," finaliza Rossângela.
Segundo Adelir Castelli, um ponto extremamente imprescindível que os consumidores precisam entender, é que hoje o produtor não chega a ganhar nem 3 reais por litro de leite,
“Muitas pessoas quando se deparam com um litro de leite a quase 8 reais no mercado, pensam que o produtor está ficando rico, quando na verdade não chegamos nem a ganhar 3 reais por litro bruto. Para se ter uma ideia, atualmente o produtor ganha cerca de R$ 2,60 por litro, porém o custo para nós produzir o leite é cerca de R$ 2,40 por litro, ou seja, se colocarmos na ponta do lápis o produtor não chega ganhar nem 40 centavos por litro de leite vendido”.
Quando o leite vai baixar?
Segundo a pesquisadora do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), Natália Grigol.
“Entendemos que, do lado da oferta, a entressafra deve seguir até meados de setembro, ou quando as chuvas da primavera retornarem. "Mas, ainda que a oferta possa se restabelecer, observa-se que os custos (do leite) podem seguir elevados".
"Ainda que o mercado de grãos sinalize preços mais baratos com o início da safra, é possível que a demanda global drene a oferta doméstica — e isso pode ser intensificado pelo câmbio desvalorizado. Por isso é difícil prever uma reversão dos preços de alimentos, como os derivados, diante do mesmo posicionamento macroeconômico que o Brasil tem adotado", finaliza a pesquisadora.